" É, A CULPA É MINHA "
" É, A CULPA É MINHA
Sou professor. Pronto, já disse tudo, a
culpa é minha! É óbvio que os únicos culpados por toda a falência da
educação são os professores. Todo mundo sabe disto. Basta perguntar aos
ausentes pais, aos irresponsáveis alunos e incompetentes governantes que
a resposta será dada em coro: “a culpa é dos professores!”.
Eis minha culpa: Por diversas vezes vi
alunos cometendo absurdos, sendo alguns destes absurdos até mesmo um
verdadeiro show de horrores. Já vi alunos cuspindo no chão (culpa do
professor), outros jogando chicletes no chão (culpa do professor),
saindo da sala sem autorização ou contrariando ordem do professor para
não saírem (o culpado é o professor). Alguns falam palavrões sem o menor
pudor (o professor que ensina?), outros mostram o dedo médio na frente
de qualquer um (o professor que ensinou isto também?). E as agressões
físicas, será que o professor manda os alunos se agredirem? E os
celulares tocando então, um verdadeiro escárnio. Alguns alunos saem no
meio da aula para atender, outros ainda pedem para o professor esperá-lo
enquanto atende e uma minoria pede licença e pergunta se pode atender. O
pior de tudo é que algumas das ligações vêm dos próprios pais. Eu não
atendo o meu celular quando estou lecionando, mas com certeza sou
culpado pelos celulares dos meus alunos quando tocam.
Se estivesse lendo este texto ao invés
de escrevê-lo provavelmente iria pensar: “Será que este professor é
indulgente?”. Já imaginando esta dúvida esclareço que vejo tudo isso
acontecendo com professores de todos os tipos, até mesmo com os mais
exigentes ou rigorosos. Então o que será que aconteceu para os alunos
chegarem a tal ponto? Como a culpa é sempre do professor, talvez nós
educadores não tenhamos aprendido a ser babás, psicólogos, terapeutas,
pais adotivos, padrastos ou madrastas, etc., portanto, a culpa é nossa.
Em várias escolas que já lecionei ou conheci me deparei com os mesmos
perfis de alunos, variando apenas de acordo com a localização (centro ou
periferia, sudeste ou nordeste), o curso (fundamental ou médio), a
instituição (pública ou privada), a série, etc. Agora pergunto: “como
posso ser culpado pela decadência de um aluno que já chega para mim pela
primeira vez aos onze, quinze ou dezoito anos de idade cheio de manias?
Como posso educar um jovem que não recebe educação em nenhum outro
lugar? Como vou conseguir exigir que meu aluno estude se nossos
governantes permitem e algumas vezes até exigem que qualquer aluno seja
aprovado?” Muitos criticam a escola e o professor, mas cadê o caminho
para que nosso trabalho seja produtivo e possa surtir efeito? Muitos nos
culpam mas não apresentam planos de educação eficientes, que sejam
pedagógicos, e não políticos. Ficam no “achismo”, mas achar é fácil, o
difícil é fazer.
Sou culpado por tudo de errado que
faço, mas não posso ser culpado pela ausência da família, pelo
menosprezo dos políticos e pelo descaso dos alunos. Como educador não
digo que não sei mais o que fazer, mas escuto isso constantemente da
boca dos pais dos alunos. Não abandono a educação, mas noto que isso já
foi feito há tempos pelos nossos líderes. Não deixo de cumprir minhas
atividades, mas muitos dos meus alunos “esquecem-se” de cumprir suas
funções estudantis. Desde que me entendo por gente a culpa pelos
percalços da educação é do professor. Mas além disso, desde que me
entendo por gente me lembro que minha família me ensinou a respeitar os
mais velhos, incluindo os meus professores, portanto, não acho que a
culpa quando o meu aluno falta com respeito comigo ou com seus colegas
de escola seja minha. Quando eu era aluno há algum tempo atrás já
existiam drogas, violência e os professores já eram culpados pela má
qualidade da educação. Na época, eram raros os crimes banais como filhos
matando pais, netos matando avós, pais matando os filhos e alunos
matando alunos, mas hoje tudo isto é muito comum, com estas notícias
constantemente na mídia. Será que nós professores somos os culpados por
tudo isto também? Afinal, se a culpa pelos males do mundo é dos
educadores, por que não fecham as instituições de ensino e passam a
função aos sábios de plantão? Com toda certeza o mundo seria muito
melhor sem nós “incompetentes” professores que estragamos a vida dos
alunos, dos pais dos alunos e da sociedade em geral. É claro que existem
péssimos professores, mas a sociedade não tem o direito de igualar
todos os profissionais da educação da mesma maneira. Os médicos não são
todos inábeis só porque alguns esquecem o bisturi dentro do paciente. Os
policiais não são todos vis só porque alguns são infames. Os políticos
não são todos devassos só porque alguns são corruptos.
Todos os dias alguém critica um
professor, mas é raríssimo vermos alguém agradecido por ter sido
aprovado em um concurso ou vestibular, uma vaga de emprego, etc. Então
quer dizer que quando um indivíduo se dá mal na vida o culpado é o
professor que lhe deu aulas, mas quando este indivíduo é um vencedor o
mérito é só dele, ele que é inteligente? Enfim, declaro-me culpado por
ter deixado de ser egoísta para compartilhar meu conhecimento com meus
alunos. Sou culpado por tentar educá-los, por tentar fazê-los evoluírem.
Sou culpado por ser professor!
Prof. Iranildo "
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